“As pessoas não são conhecidas apenas pelo seu lado
intelectual ou seus princípios, mas principalmente pelo amor. Quando amamos o
próximo, o inimigo, aí então obtemos de Deus a chave para uma compreensão de
quem seja nosso inimigo e de quem somos nós. É unicamente isto que poderá
revelar-nos a natureza real dos nossos deveres e das nossas retas ações.
Quando ignoramos a pessoa e recusamos considerá-la como tal, como um outro eu,
estamos lançando mão do ‘direito’ e da ‘natureza’, em sentido impessoal. Em outras
palavras, estamos bloqueando a realidade do outro, estamos cortando a
intercomunicação da nossa natureza com a dele, e consideramos apenas a nossa
natureza, individual, com seus direitos, suas prerrogativas, suas exigências.
De fato, contudo, estamos considerando a nossa natureza no concreto e a dele no
abstrato. E assim justificamos o mal que fazemos a nosso próximo, pois ele não
é considerado mais como um irmão, mas apenas como um adversário, um réu, um
ente maligno.
Para restaurar a comunicação, para ver a nossa unidade de natureza com a dele,
respeitar os seus direitos pessoais, a sua integridade e o direito de ser
amado, temos também de nos encarar como réu, como ele, de sermos condenados à
morte com ele, mergulhando no mesmo abismo que ele, necessitando, também como
ele, do dom inefável da graça e da misericórdia, de maneira a sermos salvos.”
Seeds of Destruction, de Thomas Merton